Bom, vamos deixar isso bem claro: Sou fã dos conceitos por trás da Indústria 5.0. Quem não adoraria a ideia de tornar nossos setores mais humanos, sustentáveis e resilientes? Mas aqui está o mais importante... eu não gosto nem um pouco do termo “Indústria 5.0”. Parece que, de repente, entramos em uma nova era, deixando a pobre e velha Indústria 4.0 para trás. Alerta de spoiler: não é bem assim.
História do termo e do conceito de Indústria 4.0
As origens da Indústria 4.0 vêm de um esforço coletivo na Alemanha que visava garantir que o setor de manufatura daquele país continuasse a liderar em um mundo cada vez mais digital. Embora o termo “Indústria 4.0” tenha sido oficialmente introduzido na Feira de Hanover em 2011, as bases para esse conceito estavam sendo estabelecidas anos antes por um grupo de estrategistas industriais, acadêmicos e funcionários do governo com visão de futuro.
No centro dessa iniciativa estava a Estratégia de Alta Tecnologia 2020 da Alemanha, um plano nacional que buscava manter o país na vanguarda da inovação tecnológica. O conceito da Indústria 4.0 surgiu dessa estratégia como uma resposta à crescente necessidade de integrar tecnologias digitais à manufatura. O termo em si tinha a intenção de simbolizar o início da Quarta Revolução Industrial, após as revoluções anteriores de mecanização, produção em massa e automação.
A Indústria 4.0 foi projetada para transformar a manufatura em um sistema altamente interconectado e inteligente, no qual máquinas, produtos e sistemas se comunicam entre si em tempo real. Esse conceito não se referia apenas à automação, mas à criação de “fábricas inteligentes” que pudessem se otimizar, prever problemas antes que eles ocorressem e até mesmo se adaptar às mudanças nas condições de demanda ou fornecimento de forma autônoma. O foco estava em integrar de sistemas ciberfísicos, junto da Internet das Coisas (IoT), do Big Data e da robótica avançada, em todos os aspectos da manufatura.
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Essa visão ambiciosa foi moldada por figuras influentes como Henning Kagermann, ex-CEO da SAP, Wolfgang Wahlster, fundador do Centro Alemão de Pesquisa em Inteligência Artificial (DFKI), e Henrik von Scheel, que desempenhou um papel no alinhamento da iniciativa com tendências digitais globais mais amplas. No entanto, a verdadeira força da indústria 4.0 estava na natureza colaborativa de seu desenvolvimento.
A Acatech, a Academia Nacional de Ciências e Engenharia da Alemanha, desempenhou um papel fundamental na ponte entre o meio acadêmico, o setor industrial e o governo. Essa colaboração garantiu que o conceito fosse tanto inovador como prático, com caminhos claros para a implementação. A “Plattform Industrie 4.0”, criada em 2013 pelas associações BITKOM, VDMA e ZVEI, foi outro componente fundamental. Essa plataforma reuniu milhares de empresas e partes interessadas de todo o espectro industrial, proporcionando um fórum para compartilhar práticas recomendadas, desenvolver padrões e impulsionar a transformação digital do setor de manufatura.
O compromisso do governo federal alemão com essa iniciativa, especialmente por meio do Ministério Federal de Educação e Pesquisa (BMBF) e do Ministério Federal de Assuntos Econômicos e Ação Climática (BMWK), foi crucial para transformar o conceito da indústria 4.0 de uma visão em uma realidade. Seu apoio forneceu os recursos necessários e o respaldo político para garantir que o setor de manufatura da Alemanha pudesse liderar o caminho na era digital.
Quando a Indústria 4.0 foi lançada oficialmente na Feira de Hanover em 2011, ela era mais do que apenas um novo termo — era o início de um movimento que redefiniria a manufatura em escala global. A iniciativa rapidamente ganhou atenção internacional, com países como Estados Unidos, Japão e China adotando estratégias semelhantes com nomes diferentes, como “Smart Manufacturing", ou Manufatura Inteligente, e “Made in China 2025”.
História do termo e do conceito de Indústria 5.0
O conceito de “Indústria 5.0” começou a surgir por volta de 2015, não de uma única estratégia nacional como o termo anterior, mas a partir de discussões mais amplas sobre a direção futura do desenvolvimento industrial. Originária do conceito de Sociedade 5.0 do Japão, a Indústria 5.0 combina tecnologia avançada com foco no caráter humano e na sustentabilidade ambiental, aprimorando a eficiência industrial e promovendo o bem-estar social e ecológico.
Um dos primeiros defensores dessa ideia foi Michael Rada, que começou a escrever sobre o Indústria 5.0 como uma forma de reintroduzir o elemento humano em um cenário industrial cada vez mais automatizado e orientado pela tecnologia. A visão de Rada era criar uma estrutura em que humanos e máquinas pudessem colaborar com mais proximidade, aproveitando os pontos fortes de ambos para obter maior eficiência, personalização e sustentabilidade na produção.
Ao contrário da Indústria 4.0, que foi lançada com um apoio governamental significativo e um foco tecnológico evidente, a Indústria 5.0 surgiu de um movimento mais popular. Ele refletia uma preocupação crescente de que o ritmo acelerado da automação e da digitalização estava deixando os trabalhadores humanos para trás. A Indústria 5.0 propôs mudar o foco para processos centrados no ser humano, em que a tecnologia serve para aprimorar ao invés de substituir as capacidades humanas.
O problema com o termo “Indústria 5.0”
Embora os princípios por trás da Indústria 5.0 — como centralização no ser humano, sustentabilidade e resiliência — sejam importantes, o termo em si gerou controvérsias e críticas significativas. Veja por que o termo “Indústria 5.0” é problemático:
Não é uma nova revolução: O nome “Indústria 5.0” sugere uma quinta revolução industrial, implicando em uma grande mudança semelhante às quatro revoluções industriais anteriores. No entanto, o setor 5.0 é mais uma evolução do setor 4.0, concentrando-se na expansão das tecnologias existentes, como IoT, IA e sistemas ciberfísicos, integrando elementos humanos e objetivos sociais. Ele não está introduzindo um paradigma fundamentalmente novo no mundo industrial.
- Indústria 1.0 = 1ª Revolução Industrial
- Indústria 2.0 = 2ª Revolução Industrial
- Indústria 3.0 = 3ª Revolução Industrial
- Indústria 4.0 = 4ª Revolução Industrial
- Indústria 5.0 = Evolução da 4ª Revolução Industrial? (até parece que faz sentido...🤣)
Já faz parte da Indústria 4.0: As ideias promovidas pela Indústria 5.0 já são inerentes ao movimento contínuo da Indústria 4.0. A colaboração entre humano e máquina, a sustentabilidade e a resiliência são extensões naturais da transformação digital que a Indústria 4.0 está impulsionando. Nesse sentido, a Indústria 5.0 não está separada da Indústria 4.0, mas é uma continuação e expansão dela.
Cria confusão e fragmentação: Ao introduzir o termo “Indústria 5.0”, há o risco de ofuscar os esforços e as inovações em andamento da Indústria 4.0. O termo pode criar uma falsa impressão de que a Indústria 4.0 está completa ou ultrapassada, o que não é o caso. A transformação digital atual ainda está em progresso.
Enfraquece a narrativa recente: O termo “Indústria 5.0” corre o risco de fragmentar a narrativa do progresso industrial ao sugerir uma falsa dicotomia entre os dois conceitos. A evolução industrial é contínua, e a introdução de um novo rótulo pode criar a ilusão de saltos desconexos ao invés de uma progressão natural. Isso pode levar a um foco equivocado, desviando a atenção do trabalho essencial que ainda está sendo feito sob a bandeira da Indústria 4.0.
Opiniões sobre a “Indústria 5.0”
Não acredite apenas na minha palavra! As opiniões em relação à Indústria 5.0, pelo que eu percebo, também correspondem ao argumento de que o termo em si é problemático e desnecessário. Os líderes e especialistas do setor não se acanharam em expressar suas preocupações com o termo, que, segundo eles, gera mais confusão do que clareza.
Figuras e organizações proeminentes do setor industrial, como o “Research Council Industrie 4.0” e a “Plattform Industrie 4.0” na Alemanha, expressaram forte oposição ao termo “Indústria 5.0”. Eles argumentam que os princípios centrados no ser humano, sustentáveis e resilientes promovidos pela Indústria 5.0 não são revolucionários, mas já estão incorporados à estrutura mais ampla da Indústria 4.0.
Por exemplo, Peter Liggesmeyer, porta-voz do Conselho Consultivo de Pesquisa da Indústria 4.0, apontou que o conteúdo que está sendo discutido atualmente sob o rótulo de Indústria 5.0 está totalmente englobado na Indústria 4.0. A introdução de um novo termo, adverte ele, poderia confundir as empresas e, possivelmente, desacelerar o ritmo dos esforços de transformação digital em andamento.
Essa crítica não se limita aos círculos acadêmicos; ela repercute no setor como um todo. O sentimento geral é que a Indústria 5.0 não é uma revolução distinta, mas sim uma progressão natural do movimento da Indústria 4.0, e que a criação de um rótulo separado pouco contribui para o avanço da conversa.
Para ter uma noção mais ampla de como o setor percebe esse termo, realizei uma pesquisa no LinkedIn que obteve respostas de 764 profissionais de todo o mundo. Os resultados foram reveladores:
- 51% das pessoas disseram que gostam do conceito, mas acreditam que ele deve ser considerado parte da Indústria 4.0. Essa maioria reflete uma forte crença de que as ideias da Indústria 5.0 são uma extensão do que está sendo feito pela Indústria 4.0, em vez de ser algo totalmente novo.
- 15% gostaram do conceito, mas acham que é necessário um novo nome. Essas pessoas reconhecem o valor dos princípios por trás da Indústria 5.0, mas concordam que o termo em si não é o mais adequado.
- 13% das pessoas apoiaram tanto o conceito quanto o nome. Esse grupo menor vê a Indústria 5.0 como um passo distinto e necessário na evolução industrial.
- 21% das pessoas não gostaram nem do conceito nem do nome. No entanto, acredito que a insatisfação desse grupo decorre mais da rejeição da necessidade de um termo separado do que da oposição aos princípios em si. É improvável que esses entrevistados argumentem contra a importância da centralização no ser humano, da sustentabilidade e da resiliência; em vez disso, eles os veem como inerentes ao que já deveríamos estar focando na Indústria 4.0.
Quando analisamos os números mais de perto, 87% dos entrevistados se enquadram em categorias que expressam algum nível de insatisfação com o termo “Indústria 5.0”. Independentemente de considerarem o conceito como parte da Indústria 4.0, de acreditarem que é necessário um nome diferente ou de não apoiarem a separação dessas ideias, o sentimento esmagador é de que “Indústria 5.0” não é o termo certo.
Uma análise mais aprofundada da pesquisa revela algumas tendências interessantes. Por exemplo, a região EMEA (Europa, Oriente Médio e África) apresentou mais oposição ao termo do que apoio, o que é particularmente significativo, considerando que o conceito se originou na Europa.
Além disso, os fabricantes (usuários) se opuseram proporcionalmente mais ao termo do que os provedores de soluções, provavelmente porque estão mais diretamente envolvidos na implementação das tecnologias e práticas da Indústria 4.0 e veem os princípios da Indústria 5.0 como uma continuação natural e não como um movimento separado.
Meu ponto de vista
Desde 2011, surgiram dois pontos de vista diferentes sobre a Indústria 4.0. De um lado, há uma perspectiva que se apega ao conceito original da “Indústria 4.0”, que gira em torno de um conjunto fixo de nove pilares, como IoT, Big Data e sistemas autônomos. Por outro lado, há uma interpretação mais ampla e flexível que vê a Indústria 4.0 como uma forma de descrever a revolução contínua e em constante evolução na manufatura e além.
Quando você analisa a questão do primeiro ponto de vista, é fácil entender por que surgiu o conceito da Indústria 5.0, que se concentra em três áreas principais: humanidade, sustentabilidade e resiliência. E, sinceramente, não me surpreenderia se víssemos outra variação surgir em alguns anos, pois essas definições são bastante rígidas em seu escopo e foco.
Mas se você vê a Indústria 4.0 da mesma forma que eu, mais como uma descrição fluida da revolução que estamos vivendo, então fica claro que não há um objetivo ou foco único e fixo. A Figura 2 é um exemplo perfeito da diferença entre uma mudança de foco e expansão e evolução.
A “Indústria 4.0” original de 2011 está presa em seus nove pilares, e agora a Indústria 5.0 europeia também se fixou em três áreas principais. Mas o ponto de vista global da Indústria 4.0 é dinâmico; está em constante evolução, e o que consideramos ser seu escopo hoje pode muito bem mudar no próximo ano!
É por isso que faço parte do grupo que reconhece que as visões de 2011 estavam fadadas a mudar, moldadas por pressões geopolíticas, avanços tecnológicos e respostas do setor, entre muitos outros fatores. O que vemos hoje como Indústria 4.0 continuará a evoluir, mas ainda não estamos no ponto em que precisamos chamá-la de uma revolução industrial totalmente nova.
Vamos guardar esse termo para um futuro distante, daqui a décadas. Ao invés disso, devemos integrar as ideias valiosas da Indústria 5.0 à narrativa contínua da Indústria 4.0. Vamos trazer esse trabalho para o domínio público e dar a ele um nome que reflita sua essência - algo como a “Força Socialmente Responsável” ou algo semelhante. Dessa forma, manteremos a continuidade da revolução que estamos vivenciando e, ao mesmo tempo, adotaremos desenvolvimentos novos e importantes.
Espero que meus argumentos sejam convincentes e que possamos concordar coletivamente em aposentar o termo “Indústria 5.0”, pelo menos até que surja uma verdadeira quinta revolução industrial. Os conceitos que ele promove são fundamentais, mas já estão incorporados ao movimento Indústria 4.0 em andamento.
Vamos manter nosso foco onde ele deve estar, simplificar nossa linguagem e evitar confusões desnecessárias. Juntos, podemos continuar a impulsionar um progresso significativo sem nos perdermos na hype de um rótulo enganador. Quem vem comigo?
* Este artigo foi publicado no site Jeff Winter e reproduzido aqui com autorização do autor.
Texto original: https://www.jeffwinterinsights.com/insights/stop-saying-industry-50
Tradução: Rafael M Sens
Revisão: Claudio Henrique Goldbach
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