Atualmente os termos Indústria 4.0 e transformação digital são frequentemente utilizados juntamente com a promessa de vantagens substanciais, como flexibilidade, adaptabilidade e agilidade nas operações industriais. Embora, em teoria, esses conceitos pareçam acessíveis e promissores, a implementação prática enfrenta uma série de desafios que geram incertezas significativas.
Aspectos como custos associados à adoção de tecnologias avançadas, a incerteza no retorno do investimento, a capacidade de capturar efetivamente os benefícios propostos e a lacuna de conhecimento técnico entre as equipes operacionais são exemplos de dificuldades que permeiam a transição para a Indústria 4.0. Essas incertezas tangíveis e intangíveis contribuem para uma resistência das empresas e executivos em abraçar plenamente essa revolução digital.
Embora existam essas dificuldades, já se sabe que a Indústria 4.0 é um caminho sem volta, pois diversas empresas estão obtendo benefícios da implementação destas soluções. Segundo a Confederação Nacional da Indústria (CNI), é estimado que o mercado da chamada Indústria 4.0 no Brasil possa atingir US$ 5,62 bilhões até 2028, com crescimento anual na faixa de 21%.
No entanto, a implementação bem-sucedida de projetos de Indústria 4.0 enfrenta desafios diversos, frequentemente explicados pelo fracasso em compreender a natureza complexa dessa transição. Projetos fracassados muitas vezes resultam de abordagens excessivamente ambiciosas, caracterizadas pelo emprego de soluções avançadas para problemas simples, sem ocorrer um prévio entendimento detalhado das reais necessidades do negócio.
Além disso, o baixo engajamento da liderança é uma barreira crítica, pois a adesão integral e o patrocínio da alta gestão são determinantes para alinhar a organização à jornada de transformação digital. Os custos elevados, especialmente relacionados à atualização do parque tecnológico, representam um desafio significativo. A incerteza para mensurar o retorno sobre o investimento contribui para a resistência das empresas, tornando difícil justificar os gastos substanciais necessários para a implementação da Indústria 4.0.
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Em vista dessas complexidades, torna-se prudente a definição de um "Roadmap da jornada de transformação digital", o qual define um guia estratégico que abrange ações de curto, médio e longo prazo que a empresa deverá buscar. Esse planejamento cuidadoso visa estabelecer uma conexão sinérgica entre as tecnologias adotadas e a visão global da empresa, integrando a estratégia de manufatura com a de tecnologia e de negócio. Além disso, é recomendada a adoção prévia de abordagens para otimizar as operações existentes, processos e materiais.
Uma prática eficaz nesse contexto é a aplicação de Lean Manufacturing, que busca a excelência nas operações de manufatura, sem necessariamente exigir a inserção de inovações digitais. Essa abordagem não apenas evita investimentos desnecessários em tecnologias, mas também destaca a importância da otimização contínua das operações existentes como um pré-requisito para o sucesso na jornada rumo à Indústria 4.0.
Para aquelas empresas que desejam iniciar sua jornada em direção a Indústria 4.0, alguns passos podem ser adotados para superar os desafios mencionados e estabelecer com precisão um roadmap que conduza a empresa do presente ao estado futuro desejado pelo negócio, conforme figura 1. As quatro etapas críticas nesse processo são: 1) Direcionadores do negócio (estratégia), 2) Diagnóstico da operação (diagnóstico), 3) Gap Analysis (desenho) e 4) Roadmap da jornada digital (roadmap). É recomendado que todas essas etapas devem ocorrer previamente ao início das ações de implementação das tecnologias e soluções da Indústria 4.0.
Na primeira etapa, é imperativo entender a estratégia da empresa e as necessidades do negócio em relação às operações. Este enfoque preconiza que a inserção de tecnologias ocorra após a compreensão integral das demandas do negócio, evitando a aplicação de tecnologia na operação e, posteriormente, a busca por justificativas para gerar valor a partir destas. A análise do cenário As Is da operação constitui a segunda etapa, envolvendo uma avaliação profunda de pessoas, processos e tecnologias existentes. Posteriormente, na terceira etapa, realiza-se a mensuração do Gap entre o cenário As Is e o cenário To Be (estado futuro desejado), seguida pela seleção de tecnologias que melhor enderecem essas discrepâncias mapeadas nas operações. Por fim, a quarta etapa envolve a definição de um roadmap incremental, estruturado para elevar progressivamente o estágio de desenvolvimento tecnológico atual ao futuro desejado.
Essa abordagem estratégica não apenas otimiza investimentos, mas também enfrenta o cenário de incertezas relacionadas aos benefícios das tecnologias, garantindo uma aplicação eficaz e sustentável, a partir da elevação gradativa do estágio de maturidade tecnológica das operações.
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Após a construção do roadmap de transformação digital inicia de fato a implementação das soluções, etapa 5) Digitalização da manufatura, onde surgem novos desafios que precisam ser superados através da adoção de abordagens estratégicas e precisas. Alguns exemplos são: (i) A gestão do conhecimento se destaca como um ponto crucial, garantindo que as equipes compreendam plenamente as novas tecnologias e estejam aptas a aplicá-las de maneira eficaz; (ii) A gestão de projetos é essencial para assegurar que a implementação ocorra dentro do prazo e do orçamento, enquanto a gestão da mudança se torna vital para superar a resistência e garantir a adesão dos colaboradores às mudanças propostas; (iii) A convergência entre Tecnologia da Informação (TI) e Tecnologias Operacionais (TO) deve ser gerenciada cuidadosamente para garantir a harmonia entre os sistemas; (iv) A capacitação de pessoas é um pilar essencial, pois a eficácia da transformação digital reside na habilidade e no conhecimento das equipes; (v) O acoplamento das novas soluções com as operações existentes apresenta desafios técnicos e práticos, exigindo uma integração gradativa e planejada.
À medida que a empresa avança no seu roadmap, há uma elevação do nível de maturidade tecnológica, o que pode abrir novas oportunidades, mas também trazer novos desafios, muitas vezes demandando uma readequação do roadmap definido anteriormente para garantir o contínuo alinhamento com as necessidades do negócio. Com o aumento de dispositivos conectados e a digitalização de processos industriais, por exemplo, as empresas passam a enfrentar exposição crescente a ameaças cibernéticas.
Segundo um estudo global realizado pelo Gartner, 88% dos líderes da área industrial consultados veem riscos cibernéticos como uma ameaça comercial e não apenas como um problema técnico da área de TI. Esse mesmo estudo revelou que 51% das empresas consultadas relataram terem sofrido ataques nos últimos dois anos. Diante desse cenário, é imperativo que as organizações adotem medidas robustas de segurança para proteger seus ativos digitais e garantir a continuidade das suas operações industriais.
Em conclusão, é indispensável reforçar a importância da construção do roadmap como uma bússola essencial na jornada de transformação digital da empresa. Apesar das inevitáveis incertezas, a elaboração cuidadosa dessa estratégia não apenas facilita o acompanhamento do progresso, mas também permite a identificação e execução de ajustes necessários ao longo do caminho. O avanço gradual na maturidade digital, um passo de cada vez, emerge como uma abordagem pragmática, assegurando uma transição sustentável e eficaz. A etapa inicial de otimização dos sistemas existentes antes da introdução de novas tecnologias é fundamental.
Ao focar em resolver os problemas operacionais atuais, as soluções tecnológicas a serem inseridas são orientadas pelas necessidades reais, evitando a implementação de tecnologias que buscam formas de entregar valor após sua implementação. Além disso, é crucial conectar essas considerações finais a temas urgentes no contexto atual, como a cibersegurança na manufatura e a necessidade de uma infraestrutura de TI robusta e confiável no ambiente industrial. Abordar essas questões contemporâneas é essencial para garantir uma transformação digital segura, eficiente e alinhada com os desafios emergentes da era digital.
*Imagem de capa: Depositphotos.com
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