A eletrônica orgânica é uma tecnologia promissora que envolve a produção de dispositivos semicondutores a partir de moléculas orgânicas à base de carbono. Atualmente, no mundo inteiro, vários grupos desenvolvem pesquisas na área. Entre as possibilidades que essa tecnologia proporciona estão as telas dobráveis e os painéis de energia solar de baixo custo. É possível, por exemplo, imprimir um dispositivo utilizando tintas semicondutoras: é a chamada eletrônica impressa. Porém, os cientistas que desenvolvem estudos nessa área enfrentam o desafio de fazer isso em escalas maiores, que vão além da laboratorial – onde, muitas vezes, é preciso trabalhar com dispositivos impressos de dois milímetros quadrados.
Uma solução inovadora veio do engenheiro Leonardo Dias Cagnani, ex-aluno do campus de São Carlos da USP, que criou um conjunto de equipamentos para auxiliar o desenvolvimento de técnicas de fabricação da eletrônica impressa. Denominado Roll-to-roll Lab, o aparelho oferece uma característica única no mundo: a possibilidade de usar seis diferentes técnicas de impressão e alternar de uma para outra sem necessidade de troca do substrato (papel, plásticos, embalagens) ou de parada do equipamento. Também foram criados dois outros produtos, que podem ser comercializados à parte: uma bomba de seringa (que controla o fluxo de tinta a ser usada na impressão) e uma glove box (caixa fechada de inox com visor de vidro, com atmosfera sem umidade e baixo nível de oxigênio).
Os equipamentos são direcionados para pesquisas laboratoriais em diversos ramos, como automotivo, de papéis e vernizes, entre outros, além de universidades, centros de pesquisa e empresas de certificação. Apesar de terem sido criados com foco principal na eletrônica impressa, o uso dos equipamentos não se restringe a essa área de estudos. Outro aspecto positivo, segundo Cagnani, é a transferência de tecnologia desenvolvida em laboratório para processos que possam ser expandidos para a indústria.
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As seis técnicas que o equipamento oferece são: rotogravura, flexografia (ferramentas de impressão modular), slot-die, knife, wire-bar e spray (ferramentas de revestimento modular). “Em nível internacional há equipamentos que oferecem só uma das técnicas. No Brasil, nenhum aparelho faz isso”, destaca o pesquisador.
O Roll-to-roll Lab foi desenvolvido em alumínio, em formato modular, nas medidas 85 centímetros de largura por 50 centímetros de altura. O peso varia de 40 a 60 quilos, dependendo da configuração do aparelho. O preço também é variável: de R$ 60 mil (na versão básica) a R$ 200 mil (versão completa com as seis técnicas de impressão).
Expectativas
“A eletrônica orgânica é uma tecnologia muito promissora. Algumas moléculas orgânicas já são usadas comercialmente em displays de alguns celulares e em televisores que usam a tecnologia OLED [organic light-emitting diode – diodo emissor de luz orgânico]”, explica o engenheiro.
Ele conta que começou a se interessar por eletrônica impressa durante o trabalho de conclusão de curso da graduação em Engenharia Elétrica, pela Escola de Engenharia de São Carlos (EESC) da USP. Essas pesquisas envolviam dispositivos OLED, mas em escala experimental, dentro dos laboratórios. As peças eram muito pequenas e mediam cerca de 1 milímetro por 1 milímetro.
Ao estudar o assunto, o engenheiro percebeu que alguns grupos que pesquisavam eletrônica impressa adaptavam equipamentos da indústria gráfica convencional, ou seja, aquelas que imprimem jornais e revistas, para produzir esses dispositivos. Mas os equipamentos convencionais são grandes, caros e usam litros de tinta. Na eletrônica impressa, as tintas são orgânicas, e também muito caras, mas usa-se miligramas do material, inviabilizando utilizá-las em um equipamento grande. Foi a partir dessa constatação que Cagnani teve a ideia de desenvolver um equipamento para eletrônica impressa de porte laboratorial que simulasse o que uma gráfica grande faz.
O engenheiro criou um primeiro protótipo do equipamento no mestrado, realizado no Instituto de Física de São Carlos (IFSC) da USP, entre 2011 e 2013, sob orientação do professor Roberto Mendonça Faria, do Instituto Nacional de Eletrônica Orgânica. Depois, no doutorado, Cagnani fez uma parceria com o Tyndall National Institute, na Irlanda, e, a partir de algumas melhorias, criou um segundo protótipo. O engenheiro passou quatro meses no Tyndal, onde chegou a desenvolver alguns projetos em eletrônica impressa.
De volta ao Brasil, o pesquisador se viu decidido a projetar um equipamento que pudesse ser comercializado. Foi quando Cagnani se uniu a outros dois pesquisadores, ambos ex-alunos da Escola de Engenharia de São Carlos (EESC), Wellisson Roberto Rogato e Rodrigo Fernandes Vernini, e, juntos, formaram uma empresa, a DevelopNow.
O grupo encaminhou uma proposta para a Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (Fapesp), dentro do Pipe, projeto que apoia a execução de pesquisa científica e/ou tecnológica em micros, pequenas e médias empresas do Estado de São Paulo. Eles foram selecionados e assim puderam desenvolver o conjunto de equipamentos para eletrônica impressa. Agora, eles submeteram um novo projeto para a fase 3 do Pipe, com foco na produção, comercialização e busca de parcerias. O resultado deve sair entre junho e julho.
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