Temos visto, em passado recente, uma série de ocorrências ao redor do mundo, nas quais foram criadas circunstâncias provenientes de situações políticas e/ou geopolíticas que geraram ou poderiam ter gerado enormes rupturas no cotidiano das pessoas e de seus respectivos países, sendo estes motivados pelo puro descaso e pela falta de preparo de seus administradores. Logicamente, em sua grande maioria, tratam-se de condições específicas e fora do controle dos mortais. Porém, seus resultados têm enorme abrangência na vida dos cidadãos comuns, que, além de tudo, ainda terão de pagar pelos infortúnios.
Apesar de estarmos mencionando exemplos de situações totalmente diferentes daquelas que estamos acostumados a vivenciar em uma indústria, elas servem perfeitamente como referência e podem ser comparadas a uma cadeia produtiva ou mesmo a uma cadeia de suprimentos de um grande negócio. Podem nos trazer grandes aprendizados, independentemente do tipo e/ou tamanho de negócio que administramos — principalmente quando este é uma Fábrica Inteligente, operando no formato 4.0.
Vou citar aqui dois exemplos que, na minha opinião, foram marcantes na minha maneira de ver e analisar erros e seus detalhes/falhas, que ocorreram ou poderiam ocorrer em uma cadeia produtiva de grande relevância.
O primeiro deles ocorreu no início do conflito entre Ucrânia e Rússia, quando surgiu um fator de grande incerteza para o Brasil relacionado ao fornecimento de fertilizantes importados, já que nosso maior fornecedor desse produto estava diretamente envolvido nesse evento.
A partir do início desse conflito, passamos a correr o risco de ficarmos sem a principal matéria-prima para um dos nossos principais negócios, que é o agro, no qual hoje somos um dos principais fornecedores mundiais de alimentos, além de responsável por uma grande participação no PIB nacional.
Devido à baixa qualidade do solo brasileiro, o cloreto de potássio se faz extremamente necessário para a cultura de grãos. Mas, apesar de existirem minas locais a 1.500 km do Mato Grosso, preferimos trazer esse produto da Rússia, Bielorrússia e Canadá, a 15.000 km de distância do local de aplicação, aumentando assim a ineficiência dessa cadeia produtiva.
Outro exemplo, também proveniente desse mesmo conflito, foi o fato de vários países europeus assistirem a seus estoques de gás, provenientes da Rússia, se esgotarem sem alternativas de substituição a curto prazo. Gasodutos foram instalados para baratear os custos, porém acabaram engessando a rede de fornecimento do produto, unificando o fornecedor e reduzindo a flexibilidade na obtenção dos insumos.
Hoje, por razões que não cabem aqui nesse contexto, os países europeus estão comprando gás a preços muito maiores para manter seus estoques de sobrevivência, expondo-se cada vez mais ao risco de passar frio no inverno e/ou ficar sem energia.
Um terceiro exemplo, mais recente, é a acomodação das taxas tributárias impostas pelos Estados Unidos referentes às suas importações de produtos de outros países, motivada por acontecimentos extremamente corriqueiros, como a mudança de governos, que ocorre a cada quatro anos, diga-se de passagem.
Essas alterações tributárias em andamento estão afetando inúmeras cadeias produtivas, e a grande maioria delas parece desprovida de planos de contingência, encontrando sérias dificuldades para achar alternativas ideais — a não ser refazer investimentos e começar tudo de novo.
Em resumo, os fatos citados acima podem resultar em mudanças drásticas no andamento de projetos da noite para o dia, ocasionando a quebra de cadência das cadeias produtivas envolvidas. Todo e qualquer fator de risco tem seu custo invisível adicionado ao preço do produto e deve ser eliminado ou contingenciado ao extremo. A troca desesperada de fornecedores só tende a piorar os resultados, aumentar o risco operacional, elevar os custos e comprometer a qualidade final dos produtos.
Voltando ao nosso mundo da Indústria 4.0, temos hoje inúmeras ferramentas de simulação, planejamento e controle para tentar minimizar problemas decorrentes de fatores como os mencionados acima.
A maioria desses fatores já foi citada e detalhada por mim em edições anteriores nesta coluna, mas vale o reforço, pois uma falha de contingenciamento pode fragilizar a eficácia ou até mesmo causar a ruptura total de uma cadeia produtiva.
Exemplos:
Falta de matéria-prima: desenvolvimento de produtos, disponibilidade regional, certificação de fornecedores, planejamento de materiais, controle online dos processos.
Quebra de equipamentos e ferramentas: especificação dos fornecedores e de seus produtos, aplicabilidade nos processos e manutenção preventiva.
Absenteísmo e turnover de colaboradores: simplicidade dos processos, ambiente de trabalho, treinamento e suporte operacional.
Mudanças no sistema operacional: simulação e critérios nas atualizações.
Redução de custos: critérios nas implementações.
A surpresa não é algo plausível, seja ela ruim ou boa.
*Imagem de capa: Depositphotos.com
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